quarta-feira, 13 de julho de 2016

Tão Tão Grande

Tão Tão Grande
Catarina Sobral
Orfeu Negro (2016)

“Tão Tão Grande" é o novo livro de Catarina Sobral, talvez não o seja no formato, mas Tão Tão Grande na importância do tema que aborda.
A autora /ilustradora transporta-nos para um quarto, onde são visíveis os brinquedos de criança, personagem protagonizada por um hipopótamo que ao acordar se depara com a transformação do seu corpo. Baseando-se na premissa kafkiana da transformação, com referências explicitas no texto e nas guardas iniciais, a ligação ao personagem é dada numa ilustração por nivelamento, com síntese de formas do meio natural em formas geometrizadas. 
As ilustrações a lápis de cera combinam com o interessante contraste entre o branco e a cor, com um evidente equilíbrio nas manchas de cor, pautadas por uma paleta que se aproxima do fauvismo. 
A distorção das perspectivas proporcionam ao leitor uma experiência imersiva e sensorial  na atmosfera do cenário afetivo do lar. O letring escrito à mão, ao invés de escrita digital, apresenta uma coesão entre as palavras, sendo também a distribuição textual da narrativa apelativa, variando o ritmo e entrosando-se com a ilustração resultado da composição manual. 
As sombras oferecem-nos um dramatismo estético, estilizando a experiência próxima de cinema "noir", o receio infantil do crescimento (como o de todas as mudanças) e da entrada na aventura de uma nova fase do desenvolvimento humano. A sombra transporta-nos para o desconhecido, o encoberto, um futuro que se inicia com dúvidas e anseios. Fases do desenvolvimento humano que crianças e adultos vivenciam revelando fragilidades e anseios. Ao contrário da transformação de Kafka, nesta narrativa, Catarina Sobral, deixa o leitor surpreendido perante a confrontação com o real e a  estranheza do crescimento, dando-lhe uma viragem não só narrativa como estética. 
É esta mudança, que por oposição à metamorfose aberrante e incomodativa de Kafka, o leitor mergulha no sentimento da voz que o próprio desconhece, num corpo confrontado com a  inevitabilidade mudança da idade. Inversão também registada nas ilustrações das guardas finais. 
Olhares atentos encontrarão leituras simbólicas. Uma ode ao crescimento, numa narrativa deliciosamente estética, recheada de arrefiares e de neologismos, característicos da autora. 

Elvira Cristina Silva
in: Newsletter Pró-Inclusão nº 100 - pág 8

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